Talvez porque a noite estivesse mais fria do que o normal...
Estava sozinho, resolvi andar, procurar alguém, alguma fonte de animação que pudesse me tirar da enorme tortura que era ter que aturar a mim mesmo no escuro, no frio, acompanhado apenas de um edredon e um livro.
Não obtive resposta, porém. Com os pés descalços, em contato com a ardósia fria coberta pelo sereno que caía tristemente àquela noite, com a sujeira das árvores que ali descansavam em paz sobre minha cabeça e com o brilho distante e seco de cada estrela que brilhava naquele céu, me vi parado. Tão repentinamente quanto parei, recomecei a andar. A cada novo passo, no entanto, me via tentando convencer a mim mesmo de que eu não era responsável por aquela caminhada. A cada passo me perguntei por que eu estaria andando, por que eu estaria pensando em fazer aquilo e o que seria de mim quando eu não pudesse mais pensar e ver esse mundo. O chão que eu pisava fora desaparecendo, aos poucos, no fim tornando tão sensível quanto o ar à minha frente.
Em desespero, perdi a esperança e a lembrança de tudo que havia acontecido de bom até ali. Me vi quieto, cego e surdo, imóvel. Teria acontecido de verdade? Não, com certeza não. Um turbilhão de perguntas sem respostas, de medos sem motivos, de acusações sem provas me passou pela mente. Nunca saberei por quanto tempo durou. Mas sei que, no exato instante em que me vi de volta à normalidade dos passos, eu não tinha me movido nada.
Porém, o medo da escuridão que a noite me proporcionava sumiu. Mas não era desse escuro que eu deixer de temer, somente. A escuridão da vida, da qual não se sai mais, de repente, tornou-se um tão insignificante estágio da vida que nem sequer superou a importância de me concentrar a cada passo de uma caminhada comum.
Me senti muito melhor, decerto. Mais velho e experiente? Não, não mesmo. Vi, naquele turbilhão, pelo que vale a pena viver. E foi somente isso. Ao que dar o real valor da vida? Uma amizade, um amor, uma crença, um sonho ou uma história? Tudo isso? Nada disso? Mais uma pergunta sem resposta. Mas a minha escolha naquele momento com certeza mudou a minha vida.